Anísio “Cabana” compositor foi integrante da ala de compositores de várias escolas de samba entre elas a Portela e a Beija Flor, do qual é considerado um dos fundadores. Sua composição mais conhecida é “Ilú Ayê”, considerado um dos mais belos sambas-enredos de todos os tempos. Os sambas de CABANA foram gravado por Clara Nunes, Mestre Marçal, Martinho da Vila, Beth Carvalho e muitos outros grandes intérpretes.
O jornalista Aydano André Motta lançou o livro ” MARAVILHOSA E SOBERANA – Histórias da Beija Flor” pela coleção “Cadernos de Samba” (Editora Verso Brasil , 2012).
Transcrevo abaixo, um pequeno trecho do livro que fala sobre a relação entre Cabana e Anísio:
“ Paixão e pragmatismo se misturam na relação inegavelmente visceral de Anísio com a Beija Flor.
A nostalgia se expressa por uma figura em especial. Cabana, nascido Silvestre David da Silva, autor de sete sambas enredo e dezenas de outras composições, tem status de ídolo para o patrono, que conhece todas as músicas do amigo e, a qualquer pedido, desanda a cantá-las.
Contam em Nilópolis que Cabana sempre dizia que seu velório seria com samba e festa, sem choro nem vela, muito menos tristeza. Enterro de sambista. Quando o dia chegou, 18 de dezembro de 1985, Anísio garantiu na quadra a realização do desejo. ” Foi um festão, com muito samba e comida a vontade. Uma noite inesquecível. Cabana foi muito importante para a Beija Flor” relembra Ary José Rodrigues, presidente do Conselho Deliberativo da escola, na qual está desde os tempos do bloco.”
Silvestre David da Silva, o Cabana é sinônimo de compositor para a Beija Flor. Legítimo pioneiro, Cabana foi figura marcante não apenas na agremiação que ajudou a fundar, mas também na própria construção do moderno carnaval carioca. Passados mais de 25 anos de sua morte, sua importância só faz crescer. E embora tenha deixado seu nome como compositor também em outras escolas, Cabana será sempre associado ao carnaval de Nilópolis.
Inscrito na história da agremiação como autor de seu primeiro samba enredo – “Caçador de Esmeraldas” de 1954 – Cabana foi ainda um dos responsáveis pela criação da Beija Flor como escola de samba propriamente dita: foi ele quem registrou, em 1953, o então bloco Associação Carnavalesca Beija Flor na Confederação das Escolas de Samba para o desfile oficial de 1954, no segundo grupo. O resto é história: “Caçador de Esmeraldas” levou a escola a seu primeiro título e Cabana transformou-se em símbolo da Ala de Compositores da Beija Flor. “Ele tinha um estilo único, tanto de compor quanto de cantar. Era reconhecido em todo o Rio de Janeiro e com ele a Beija Flor seguia junto” afirma Gilson Doutor.
Nascido a 22 de julho de 1924, no bairro da saúde, Silvestre ganhou o apelido de “Cabana” logo que começou a compor em meados dos anos 40. Mesmo não tendo participado da histórica reunião de dezembro de 1948, que criou a Associação Carnavalesca Beija Flor, esteve sempre presente na evolução do então bloco de carnaval.
“Quem trouxe o Cabana para a escola foi o Zairo Rodrigues, o Zairo Gogó de Ouro, o melhor crooner que a escola já teve” conta o compositor Ary Carobinha. “ Na época, o pioneiro compositor já defendia sambas na escolas União Entre Nòs, Deixa Malhar e Unidos da Barão de Petrópolis. Acho que foi quando ele saía nessa escola do Rio Comprido, no final dos anos 40, que tomou a navalhada que lhe deixou uma cicatriz no rosto” recorda Carobinha.
O grande passo para a aparição do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Beija Flor foi dado por Cabana em pessoa. Em 1953, ele tomou a iniciativa de registrar a então Associação Carnavalesca como escola propriamente dita. Em seu primeiro carnaval na avenida ( até então só desfilava em Nilópolis e adjacências), a Beija Flor venceu o campeonato do segundo grupo.
Cabana era muito popular, conhecido em todas as agremiações e rodas de samba. “As músicas que ele fazia levavam o nome dele longe!” diz Carobinha. Com suas boas relações entre os sambistas, Cabana trouxe para a escola compositores importantes com Osório Lima, Walter Batuqueiro e Ary de Lima. Mas ele não era só irreverência e bom papo, nem se restringia a escrever seus cultuados sambas. Trabalhava duro, participando de todas as etapas da confecção do desfile da Beija Flor – da organização dos ensaios ao preparo das fantasias. “Até carro alegórico ele ajudava a montar” lembra Aluízio Ribeiro, presidente da Velha Guarda da escola.
Depois de emplacar em 1962 o samba “Dia do Fico” com o qual a Beija Flor chegou ao segundo lugar do grupo principal do carnaval carioca – Cabana amargou em 1964 o reverso da glória. Defendendo seu “Café, Riqueza do Brasil”, a escola de Nilópolis foi rebaixada para o terceiro grupo, o fundo do poço em sua história. Coincidência ou não, algum tempo depois o compositor se afastaria da Beija Flor, partindo para a Portela.
Nos cinco anos que ficou na Portela, Cabana teve seu primeiro samba gravado (“Tal é o dia do batizado” para o carnaval de 1967) e firmou as duas principais parcerias de sua vida – Martinho da Vila e Norival Reis. Em 1973, afinal, retornou a Nilópolis, onde mais uma vez foi aclamado como figura histórica na escola. “ Foi uma tremenda festa quando ele voltou. Apesar de ele ter feito belos sambas na Portela, a casa do Cabana sempre foi a Beija Flor” afirma Aluízio.
Uma das últimas “aquisições” de Cabana para a Beija Flor acabou sendo uma das mais populares também. Foi através de Cabana que o puxador Neguinho da Beija Flor, hoje verdadeiro símbolo da escola de Nilópolis, chegou a agremiação em 1976. “ O Cabana já me conhecia – na época eu cantava no bloco Leões do Iguaçu – e me indicou para o Anízio (Abrãao David). Ele me deu muita força” lembra Neguinho. O pé quente do fundador funcionou: composto e defendido pelo próprio Neguinho, o samba “Sonhar com Rei dá Leão” levou a Beija Flor a seu primeiro campeonato no grupo principal.
Após voltar a Beija Flor, Cabana só venceu mais um concurso de samba enredo. Tem gente que acha isso uma injustiça. “ Quando ele voltou, as coisas não ficaram como eram antes. Na verdade, diziam que o estilo dele estava ultrapassado, não servia mais. Mas a boa música nunca fica ultrapassada” diz Gilson Doutor.
Cabana compôs seu último samba em 1986, uma parceria com C arlinhos Criação. Vitimado por um enfarte, morreu no dia 18 de dezembro, aos 62 anos. Seu corpo foi velado na quadra da escola, ao som de muito samba, como era seu desejo expresso. Ary Carobinha recorda emocionado: “ Foi uma grande roda de samba. A bateria chegou, e cantamos todos os sambas dele, a noite inteira.