Monarco comprova em disco majestoso que o tempo da velha guarda do samba é (sempre) hoje

Album

O tempo de Monarco também é hoje. O que legitima o título, Monarco de todos os tempos, do álbum produzido por Mauro Diniz e lançado pelo bamba octagenário neste mês de outubro de 2018 em edição da gravadora Biscoito Fino.

Basta ouvir o inédito samba que abre o disco de repertório inteiramente autoral, Agora é tarde (Monarco), para identificar a nobreza melódica do samba associado à velha guarda. Nobreza que nunca deveria sair de pauta em qualquer tempo.

Por mais que haja certa linearidade e até algum excesso no conjunto de 16 sambas apresentado no álbum, a obra soa atemporal. O aristocrático D.N.A. melódico e poético deste cantor e compositor carioca – nascido há 85 anos com o nome de Hildmar Diniz – irmana sambas novos e antigos que geralmente versam sobre o desalinhar de corações partidos por desilusões amorosas.

Alguns sambas nem são tão novos, embora fossem até então inéditos em disco, caso de Alegria das flores (Monarco), composto em 1972 e somente gravado neste ano de 2018 neste álbum em que Monarco também registra pela primeira vez sambas como o lírico Beija-flor.

Capa do álbum ‘Monarco de todos os tempos’ — Foto: Marcos Hermes

A propósito, Beija-flor junta a assinatura do bamba com a do filho Mauro Diniz, que, além de ter produzido do disco, criou os arranjos formatados com fidelidade aos cânones do samba dito da antiga.

Outros sambas já tinham ganhado registros fonográficos, mas soam como se fossem novos, casos de Aurora da minha vida (Monarco) – lançado em 1978 sem repercussão pela cantora Sônia Lemos – e de Hora da partida (Monarco e Mauro Diniz), lançado em 1989 na voz de Zeca Pagodinho.

Descendente da dinastia portelense de Monarco, Pagodinho figura no álbum Monarco de todos os tempos como convidado de outro samba apresentado em disco de 1989, Seu Bernardo Sapateiro (Monarco e Ratinho), e composto em tributo a um frequentador das rodas de samba do morro de Mangueira.

Monarco apresenta sambas nobres como ‘Agora é tarde’, destaque do repertório — Foto: Divulgação / Marcos Hermes

Tão tradicional no Carnaval carioca quanto a Portela de Monarco, a Mangueira é a escola de samba adotada no Rio de Janeiro (RJ) pela maranhense Alcione, cantora que também comparece no disco para saudar com Monarco a capital do estado natal, musa inspiradora de Uma canção para São Luís.

Este samba inédito para a cidade de São Luís soa, no mapa do disco, mais inspirado do que o também inédito Samba pra Maricá, samba que parece sobrar em álbum que ganharia maior coesão se tivesse perdido algumas das 16 faixas.

Oportuna lembrança do cancioneiro do bamba, Obrigado pelas flores(Monarco e Manacéa, 1979) é samba indispensável que se alinha com a ideologia do repertório – em que as flores são temas recorrentes, aliás – e que exala o mesmo frescor da gravação original, feita por Beth Carvalho há 39 anos.

Monarco e Alcione fazem dueto em samba que saúda a cidade de São Luís do Maranhão — Foto: Divulgação / Biscoito Fino

Embora quase resvale no balanço do xote, Vieste, beijaste, fugisteacaba seguindo a cadência bonita típica do samba de Monarco que reina no disco.

Com a recente saída de cena de Otto Enrique Trepte (1922 – 2018), o Casquinha, Monarco se tornou neste mês de outubro o último remanescente da Velha Guarda da Portela, agrupada por Paulinho da Viola em 1970.

O passado de glória desses baluartes do samba jamais invalida o fato – corroborado pelo presente disco do coautor de Vai vadiar (Monarco e Ratinho, 1998), samba que virou clássico instantâneo ao ser lançado há 20 anos – de que o tempo de Monarco também é (sempre) hoje. (Cotação: * * * *)

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